Comportamento

A verdadeira prova de amor

29/07/2017

Muita gente torceu o nariz na primeira edição da campanha que incentivava as pessoas a confeccionar e distribuir pequenos corações de pano. Pior: algumas não entenderam o espírito da coisa e quase que entraram em luta corporal na disputa para ver quem conseguia pegar mais deles, na Praça Mauá. 

Ao longo dos anos, o objetivo da Ação do Coração acabou sendo entendido pela maior parte da população e, hoje, nunca se revelou tão necessária. Aparentemente, todos sabem o significado de sentimentos como amor, tolerância, fraternidade e perdão. O grande problema é praticá-los no dia a dia. Com quem se gosta é até fácil, o problema é com os desconhecidos ou, ainda mais, com aqueles que pensam completamente diferente.

E é justamente esta a proposta da campanha capitaneada por Alexandre Camilo, uma homenagem a seu irmão (Eduardo Furkini, falecido, ironicamente, em decorrência de um ataque cardíaco, em 2011). Camilo, que hoje preside uma entidade beneficente que leva o nome do irmão, idealizou a Ação do Coração inspirado em uma iniciativa semelhante que conheceu em Viena (Áustria). 

Além de estimular a reflexão, a campanha também tem resultados mais palpáveis aos mais práticos: no ano passado, foram arrecadados 21,2 mil peças de roupas, 6,1 mil alimentos e 4 mil brinquedos. E distribuídos 135 mil corações de pano.

A Ação do Coração acontece quarta-feira (2), às 11h, na Praça Mauá, com a distribuição dos corações confeccionados. A programação conta ainda com apresentações artísticas e um ato inter-religioso.

 

Intolerância, remorso e perdão: tempestade de emoções 
Não faltam exemplos de intolerância no dia a dia, pelos mais variados motivos: política, religião, sexualidade, futebol… Os conflitos se acentuam e ficam mais visíveis ainda por conta das facilidades proporcionadas pelas novas tecnologias, sobretudo a internet, suas redes sociais e aplicativos de comunicação. Nesta entrevista, a psicóloga Gisela Monteiro fala sobre sentimentos como intolerância, remorso e perdão. 
 

Intolerância ocorre mais por desconhecimento dos valores/características do outro ou por realmente saber quais são eles e desaprová-los? 
Gisela Monteiro-
Como todo sentimento, é muito difícil explicar a origem da intolerância de uma única maneira. O que se sabe é que a informação acerca de um assunto pode ajudar, mas não necessariamente consegue mudar sentimentos. O binômio tolerância/intolerância tem a ver com uma capacidade/incapacidade de aceitar as diferenças entre as pessoas, sociedades ou culturas, sejam elas religiosas, políticas, esportivas, de valores etc. O que se pode afirmar é que a forma como somos criados tem uma grande influência. Se nos desenvolvemos em ambientes sociais com muitas diferenças, com oportunidades de trocas sociais variadas, tendemos a conviver com elas de forma mais natural, mais orgânica. Se, por outro lado, o desenvolvimento se dá valorizando apenas alguns representantes dessas diferenças, há a tendência a que sejamos intolerantes e segregacionistas. 

 

No caso do desconhecimento (o pré-conceito) há ainda a chance de a pessoa se informar e eliminar a intolerância. Mas quando a intolerância ocorre pela discordância, há o que fazer?
Gisela
– Para mudar isso, os resultados mais interessantes têm sido não apenas divulgar informação, mas oferecer experiências de convivência social entre os diferentes grupos ou de conhecer histórias reais nas quais alguns valores/referências diferentes são utilizados.  Há um exemplo interessante de uma ONG americana chamada Exhale, criada por Aspen Baker, uma moça com posição muito firme contra o aborto, até que ela mesma teve uma gravidez indesejada e fez um aborto. Ela ficou muito chocada consigo mesma por ter decidido abortar, mas mais ainda com as amigas pra quem contou seu aborto. Muitas delas já tinham abortado mas não contaram a Aspen porque acharam que ela não as compreenderia e acabaria a amizade. Por conta dessa experiência ela criou a ONG Exhale, cujo objetivo é ouvir as mulheres que fizeram aborto, numa perspectiva de escuta interessada, descompromissada de julgamento. As informações sobre o aborto, por exemplo, envolvem aspectos legais, morais, religiosos, científicos, filosóficos, psicológicos, todas em um plano mais abstrato, genérico. Ao conhecer a história de uma mulher que praticou o aborto, suas motivações, conflitos, seu sofrimento, sua dor, nos aproximamos das pessoas e diminuímos a ânsia de julgar o outro. Considero essa a melhor estratégia para diminuir o preconceito e a intolerância.

Por que é tão difícil para a maioria das pessoas superar o remorso? 
Gisela-
O remorso é um arrependimento resultado de uma ação ou decisão considerada equivocada por quem a praticou. É um sentimento natural e saudável, na medida em que é resultado de uma autoavaliação e dá margem a tentar uma reparação, um pedido de desculpas. Sentir culpa e remorso faz parte da vida. Sentir remorso e culpa com muita frequência ou intensidade pode se tornar um problema. Não acho saudável não sentir remorso nunca. E é claro que algumas ações e/ou decisões podem não ter reparação.

 

Perdoar não significa esquecer. Então, como administrar estes sentimentos?
Gisela-
O perdão supõe aceitar o pedido de desculpas de uma pessoa entendendo que há um sincero reconhecimento e tentativa de mudança de comportamento. Perdoar significa dar outra oportunidade, ser generoso, compreensivo. Se é banalizado, pedido e concedido sempre, perde seu valor e seu significado, fica vazio. Pedir e conceder perdão de forma sincera exige grandeza e esforço das duas partes.

 

Emoções interferem  na saúde do  músculo cardíaco

Este ano, a campanha tem como tema "Saúde, coração e ação", com destaque para as condições do músculo cardíaco, do ponto de vista fisiológico. No evento, serão realizadas diversas atividades, como aferição de pressão arterial, teste de glicemia, orientação nutricional e incentivo à prática de atividade física. Mas, além dos hábitos (alimentação, tabagismo, consumo exagerado de álcool e sedentarismo), sentimentos como raiva e angústia interferem diretamente no funcionamento do coração, alerta o cardiologista Silvio Carlos de Moraes Santos. 

"Situações que geram exacerbações do estresse, como os sentimentos de raiva, ódio e angústia, produzem elevação dos níveis de substâncias químicas na circulação (como adrenalina e cortisol), levando a vasoconstricção (diminuição do diâmetro dos vasos sanguíneos), aumento da frequência cardíaca e aumento do gasto energético do músculo cardíaco, que tem que trabalhar em excesso, o que é prejudicial ao coração, a longo prazo", explica.

"Como consequência, pode favorecer o aparecimento da hipertensão (pressão alta) que é um dos principais fatores de risco para doenças cardiovasculares, além de contribuir com o processo de aterosclerose (que leva ao entupimento dos vasos), podendo influir, portanto, nos mecanismos que produzem o infarto e a morte súbita", completa.

Para o cardiologista, o remédio para controlar estes sentimentos não está em comprimidos ou injeções, mas no estilo de vida. "Vida familiar gratificante, organização da economia pessoal, com menos sobressaltos, e esperar melhores condições da sociedade em que se vive, em relação a desenvolvimento socioeconômico, aspectos de segurança pessoal e coletiva, entre outros itens, que possibilitem uma existência mais feliz e com menos preocupações", pondera.