Comportamento

Lições da greve

02/06/2018

A greve dos caminhoneiros, que paralisou praticamnte todo país, trouxe prejuízos ainda incalculáveis para a economia nacional e a vida das pessoas. Mas, se é que pode se classificar como aspecto positivo, deu a oportunidade para a reflexão sobre várias características de nossa realidade que podem ser mudados – para melhor. Modificações a serem feitas a nível pessoal ou coletivo. Confira:
 

Mudanças pessoais

Transporte


Com a escassez de combustíveis, as pessoas ficaram apreensivas diante da possibilidade de abastecer os carros particulares e deixarem de fazer os deslocamentos costumeiros (ir ao trabalho, levar os filhos na escola, fazer compras, ir fazer exames ou ao médico etc). A situação deu a oportunidade para refletir sobre a real necessidade destes descolamentos (quais são fundamentais) e a possibilidade de fazê-los de outras maneiras (a pé, de bicicleta, carona compartilhada, transporte coletivo etc). 

 

Agenda
Por conta das dificuldades impostas pela greve, várias atividades foram interrompidas e, consequentemente, compromissos cancelados ou adiados. Devido à rotina atribulada, muitas pessoas não percebem que se atribuem diversas tarefas e muitas delas não são essenciais. A paralisação deu chance para cada um refletir, se organizar e decidir o que realmente faz a diferença no seu dia a dia, o que é apenas complementar e o que é completamente dispensável (e poderia ser substituído com tempo livre para passar com a família e amigos ou dedicado a atividades mais prazerosas).

 

Consumo


O desabastecimento, não só de postos de combustíveis, mas de estabelecimentos comerciais (principalmente alimentos) obrigou as famílias a procurarem alternativas de consumo. Fez concluir que alguns produtos não são essenciais como se pensava, estimulou a definição de alternativas. E, o mais importante, incentivou a racionalização do consumo. Diferente de racionar (que significa reduzir, pura e simplesmente, a quantidade dos produtos), racionalizar se refere a planejar o consumo e evitar o desperdício. 
 

Mudanças Coletivas

Transporte de cargas
A primeira conclusão mais evidente da greve dos caminhoneiros refere-se ao modal priorizado pelo Brasil para transportar suas cargas: o rodoviário, em detrimento do ferroviário. Segundo a Confederação Nacional de Transporte (CNT), no Brasil, 65% da produção é deslocada em caminhões; 20% por trens; 12% por hidrovias; 3% por dutos e 0,1% por via aérea. Boa parte do que é carregado pelas rodovias poderia ser transportado por ferrovias, de modo mais eficiente e barato.

 

Em países com dimensões continentais como Estados Unidos, Rússia e China, a maior parte das cargas é feita por ferrovias. O Brasil tem cerca de 1,6 milhão de quilômetros de estradas e apenas 15 mil quilômetros de linhas férreas. Os Estados Unidos, cuja extensão territorial é apenas 10% maior que o Brasil, possuem 226 mil quilômetros. Enquanto o custo logístico brasileiro (transporte, estoque, armazenagem e serviços administrativos) consome 12,7% do Produto Interno Bruto, nos Estados Unidos é de 7,8%. O Brasil tem 1.664 milhões de veículos para transporte de cargas. Uma composição ferroviária é capas de transportar a mesma carga que 320 caminhões. 

 

Transporte coletivo
Segundo o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), o Brasil tem 63,4 milhões de veículos de passeio, 13,4 milhões de motocicletas e 389 mil ônibus. Os dados evidenciam a prioridade ao transporte individual, em detrimento do coletivo. Durante a greve, as ruas de todo o país ficaram praticamente vazias. Imagine se, com a volta da normalidade, as vias fossem ocupadas por veículos de transporte coletivo, em vez de particulares. Além de viagens mais rápidas e baratas, o impacto ambiental seria reduzido, com a menor emissão de poluentes e produção de barulho. 

 

Sistema tributário
A crise lançou luz, mais uma vez, sobre o sistema de cobrança de tributos no Brasil, que penaliza mais o cidadão comum. Muita gente se surpreendeu ao saber que quase metade do preço final do combustível equivale a imposto. E esta situação se repete no valor de outros produtos e serviços. Além disso, as idas e vindas do governo Temer revelou que alguns setores específicos se beneficiam de desonerações (ficam livre de pagar impostos). Como não existe almoço grátis, se alguém deixa de pagar, outros são convocados para pagar.

 

O Brasil é um dos países que têm um dos sistemas tributários mais injustos do mundo. Quanto mais uma pessoa ganha, menos ela paga. Isso acontece porque o modelo brasileiro tributa mais o consumo, o que penaliza quem ganha menos. Dados da própria Receita Federal indicam que os tributos (diretos e indiretos) sobre produtos e serviços correspondem a 51,2% da arrecadação; sobre salários, 24,98%; sobre a renda, 18,11%; e sobre a propriedade, 3,93%. 

Alguns exemplos: a quantidade de imposto de um quilo de feijão, por exemplo, pesa muito mais no orçamento de quem ganha um salário mínimo do que quem ganha R$ 10 mil por mês. Cobra-se imposto sobre a propriedade de um carro popular mas isenta-se a propriedade de helicópteros e iates. Um trabalhador com carteira assinada que ganha R$ 2 mil mensais paga 7,5% de Imposto de Renda; já o dono de uma empresa que recebe R$ 200 mil a título de lucros e dividendos, não paga nada.