Comportamento

As eleições passam, mas as relações ficam

06/10/2018

A eleição presidencial deste ano vem motivando debates acalorados que prometem continuar mesmo após a definição do vencedor, não importa o resultado. As eleições acabam mas as relações entre os pobres mortais (de amizade, familiares, profissionais etc) continuam e será preciso mantê-las. Nas redes sociais, pode-se excluir o contato, mas o que fazer quando quem discorda da sua opinião e o seu tio ou irmão, o colega de trabalho, seu amigo de infância, seu advogado ou o médico que lhe atende há anos?

Especialista em analisar perfis comportamentais, o neu­­ropsicólogo Deibson Silva explica que, primeiramente, é preciso identificar que tipo a pessoa discordante é. Há pessoas com quem é possível trocar ideias; com outras, o diálogo é impossível. 

“Quando existe na fala do outro uma ‘verdade absoluta’, uma cegueira, aquela discussão não produzirá efeitos sadios. Assim, não é preciso se expor e arriscar a relação ou até mesmo a integridade física”, argumenta. “E se a pessoa insistir num embate que começa desta forma, se coloca também neste lugar de fanatismo”, completa.

 

Diálogo civilizado


Se é possível estabelecer uma conversa civilizadamente, o debate deve ser feito com serenidade e argumentos. O mais provável é que a pessoa não dará o braço a torcer, não dirá imediatamente “você me convenceu, vou mudar completamente a minha opinião”. Mas a fará refletir, questionar as convicções que tinha até então. Num primeiro momento, deixá-la em dúvida diante das próprias opiniões interromperá (ou ao menos inibirá) a virulência com que ela espalha estas ideias. Num segundo momento, poderá, sim, fazê-la rever seu posicionamento. 

Deibson Silva explica que, ao expor suas opiniões, é preciso deixar claro os motivos que o leva a pensar daquela forma. “É fundamental ter argumentos fortes, analisar os fatos friamente, lembrando que toda situação tem várias facetas”, diz. Ele acrescenta que, ao defender seu posicionamento, é necessário indicar pontos que precisam ser melhorados, desenvolvidos. “Desta forma, mostramos ao outro que não estamos defendendo uma verdade absoluta, pois temos uma visão crítica e realista, apontamos pontos positivos e o que precisa ser melhorado dentro das propostas que defendemos. Por isso, devemos desconfiar sempre das pessoas que trazem verdades absolutas, porque não é uma visão lógica, mas sim passional. Diante do momento que o Brasil vive, precisamos ser críticos, ter visão lógica das coisas”, declara o neuropsicólogo.

Ao apresentar a sua opinião, a pessoa deve estar abalizada em dados e fatos que correspondam ao mundo real e não naquilo que ela imagina que seja ou, pior, no que ela gostaria que fosse. 

 

Debater, sim


Excetuando os casos em que a pessoa discordante não admite o diálogo, é preciso, sim, debater as ideias. “Ao contrário do que se imagina, os conflitos são saudáveis para as relações humanas porque nos colocam diante de uma pluralidade de ideias que é importante para aprender sobre o respeito mútuo”, afirma o neuropsicólogo Deibson Silva. Segundo ele, o problema é que, atualmente, muitas pessoas consideram quem pensa diferente como um inimigo, um adversário a ser combatido. “Esse tipo de comportamento demonstra falta de maturidade emocional. Cada pessoa no mundo tem uma personalidade própria, valoriza coisas diferentes, tem opiniões diferentes e isso é sadio, não deveria fazer ninguém inimigo”, completa.

Segundo ele, o que pode impedir a deterioração do relacionamento (familiar, profissional, de amizade etc) é o jeito de se posicionar. “Se gerencio minhas emoções e me posiciono de forma madura, eu não só posso, como tenho todo o direito, de expressar minhas opiniões. Da mesma maneira, também preciso saber ouvir algo que não gosto ou discordo. É saber se controlar e dialogar. Muitos dos conflitos são resultados da maneira como se fala e nem tanto sobre o que se fala”.

 

Redes sociais
A internet facilitou a emissão de opiniões: na ponta dos dedos, imediatamente, no conforto do seu lar. Este cenário facilita manifestações impulsivas e o fato de não haver um contato presencial estimula a agressividade e grosseria. Mas, ao emitir sua opinião nas redes sociais, a pessoa não pode esquecer que quem a lê é uma pessoa do mundo real e fatalmente será necessário conviver com ela, nas diversas situações, muito além do ambiente virtual. E nunca é demais lembrar que ofensas na internet não livram a pessoa de respondê-las na Justiça (injúria, calúnia e difamação).

 

Fake news
Em tempos de redes sociais de grupos de WhatsApp, a tendência é a pessoas disseminar os conteúdos que reforçam as suas convicções. O problema é que em muitos casos são boatos e distorções, as famosas “Fake News”. Nesse sentido, é fundamental, ao receber uma mensagem que é claramente inverídica, avisar quem a enviou —mas com cordialidade.

 

Muita calma nessa hora

• Se perceber que a pessoa tem “certeza absoluta” e não admite o diálogo, simplesmente caia fora
• Caso seja possível conversar, exponha seu ponto de vista com serenidade e argumentos
• Saiba diferenciar como o mundo realmente é do que como você imagina que o mundo seja, ou como você gostaria que ele fosse
• Cuidado com as Fake News. 
• Esteja preparado para ouvir o que não concorda
• Não seja o dono da verdade. Toda situação admite abordagem sob vários ângulos. 
• Mesmo que sua argumentação seja coerente, admita que ela sempre pode ser aperfeiçoada.
• Não queira que o outro mude de opinião imediatamente. Dificilmente alguém “dá o braço a torcer” instantaneamente. Estimule a reflexão, coloque “a pulga atrás da orelha” e respeite o ritmo de raciocínio do seu interlocutor.
• Esteja preparado para mudar de opinião. Admitir estar equivocado é sinal de sabedoria.