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Chacina anunciada

02/02/2019

Um dos moradores de Brumadinho descreveu o que aconteceu na cidade: “Não é acidente, é chacina…”. Muita gente sabia o risco que a população corria, inclusive a própria Vale e autoridades, mas os poderosos ignoraram, colocando interesses financeiros acima de vidas humanas e do provável dano ao meio ambiente.

Foi uma decisão consciente, baseada no princípio de que no Brasil a Justiça não funciona e que este, definitivamente, é o país da impunidade. Acidente é uma coisa, tragédia anunciada é outra – mas a população brasileira paga o preço de sua omissão, seja por ignorância, seja por absoluta falta de informação.
O Poder Judiciário brasileiro é um dos mais caros do planeta, mas ele é ineficiente para a sociedade justamente porque a maioria dos que decidem está preocupada apenas em manter seus escandalosos privilégios.

 O STF, a mais alta corte do país, perde tempo discutindo se o cidadão pode ou não levar pipoca ao cinema, direito ao auxílio moradia de autoridades, ou analisando centenas de habeas corpus para um ex-presidente condenado por corrupção e lavagem de dinheiro, mas é incapaz de debater questões realmente relevantes.

Depois da segunda grande tragédia ocorrida em Minas, o presidente do STF, Dias Toffoli, anunciou uma parceria entre o Judiciário e o MP para acompanhar episódios semelhantes. O ministro afirmou que vítimas de tragédias como às de Mariana (em 2015) e da Boate Kiss (em 2013) não tiveram justiça. Embora tardio, fez um pedido de desculpas público. E disse esperar que isso não se repita com as vítimas de Brumadinho.

Justiça é o mínimo que se pode esperar em um país que se considera parte do mundo civilizado. Mas o que aconteceu em Brumadinho é algo não apenas inaceitável, como inacreditável. No ano passado, o presidente da Comissão de Minas e Energia da Assembleia de Minas Gerais, deputado João Vitor Xavier, declarou, em sessão, que não conseguia dormir direito porque sabia que a tragédia de Mariana iria se repetir. O deputado queria impor regras mais duras de fiscalização, porque “o modelo atual é obsoleto”. Foi voto vencido.

Já o responsável pela vistoria de minas e barragens autorizou o uso do dinheiro destinado à fiscalização para bancar uma viagem de servidores a Ouro Preto. E a Vale, que sabia dos riscos, reduziu em 44% os gastos com segurança.

Se não houver punições severas e rígida fiscalização, a chacina vai continuar.

 

Foto: Ricardo Stuckert/Fotos Públicas