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Resenha da semana: Todos Já Sabem

02/03/2019

O iraniano Asghar Farhadi é um dos meus diretores favoritos e desde que se tornou mundialmente conhecido pela obra prima A Separação, de 2011, longa que ganhou o Oscar de Melhor Filme estrangeiro naquele ano, tem sido apreciado por cinéfilos de todo o mundo devido o modo com que insere em sua narrativa, conflitos morais, religiosos e de classes sociais. Quem ainda não viu a Separação não sabe o que está perdendo (o longa está em minha lista de melhores de todos os tempos). Em seus filmes não há culpados nem vilões, o que transforma suas histórias únicas e que poderiam fazer parte de qualquer núcleo familiar. É isso o que torna os filmes deste diretor espetaculares e de uma realidade incrível, sendo este Todos Já Sabem, seu filme mais acessível por trazer, pela primeira vez, estrelas internacionais ao seu comando.

No longa, quando sua irmã se casa, Laura (Penélope Cruz) retorna à Espanha natal para acompanhar a cerimônia. Por motivos de trabalho, o marido argentino (Ricardo Darín) não pode ir com ela. Chegando no local, Laura reencontra o ex-namorado Paco (Javier Bardem) que não via há muitos anos. Durante a festa de casamento, uma tragédia acontece. Toda a família precisa se unir diante de um possível crime de grandes proporções, enquanto questionam se o culpado não está entre eles. Na busca por uma solução, segredos e mentiras são revelados sobre o passado de cada um. Asghar Farhadi parte da mesma premissa de seu primeiro filme Procurando Elly, um suspense onde constrói aos poucos os relacionamentos daquela família e apresenta seus personagens e características ao público, para depois presenciar a ruína daquele núcleo mediante os problemas que são desencadeados. O diretor escreve excelentes diálogos que soam extremamente naturais e poderiam sair da boca de qualquer pessoa que você conheça. Com uma narrativa complexa e deixando ao público julgar positiva ou negativamente seus personagens, o diretor e roteirista fornece razões plausíveis para acontecimentos extremos, o que se tornaria melodramático nas mãos de um roteirista menos experiente. O suspense tem uma sufocante construção a medida que os fatos vão se desenrolando e a tensão aumentando, sendo que qualquer um dos presentes pode ser o culpado. Aqui, o caminho que o diretor constrói vale mais do que a chegada, sendo sua resolução um tanto quanto frustrante. Talvez, este longa seja o menos original da carreira de Farhadi, por seguir a risca todas as convenções deste gênero, mas o diretor é talentoso demais e consegue elevar o nível do filme por apresentar uma história profundamente humana.

A direção de fotografia explora os cenários ensolarados e paradisíacos com uma câmera ágil sempre seguindo seus personagens aliada a uma montagem que beneficia todos os atores, equilibrando todas as participações sem que ninguém seja esquecido pelo público.

Trabalhando pela primeira vez com atores latinos, o diretor escolheu seu elenco a dedo e trabalha com os melhores aqui, mesmo nenhum se destacando individualmente. Javier Bardem volta ao personagem sedutor e sua presença de tela acaba apagando o ator Ricardo Darín, que provavelmente seja o melhor ator argentino de todos os tempos, mas aqui fica em segundo plano. Completando o elenco, temos Penelope Cruz segura bem a dualidade e peso que a personagem carrega.

Asghar Farhadi tem aqui seu filme mais fraco entre todos que já dirigiu, com um resultado mediano sobre superação de traumas, segredos e mostra como o passado sempre fará parte de nossas vidas, mesmo que tentamos esquecer. Mas estamos falando de Asghar Farhadi, que mesmo com seu filme mais fraco, consegue ser acima da média de qualquer coisa apresentada neste início de ano.

Curiosidades: Essa é a quarta colaboração entre Javier Bardem e Penélope Cruz, as anteriores foram “Amando Pablo”, “Vicky Cristina Barcelona” e “Jamón, Jamón”.

 

Foto: Reprodução