TV em Transe

Casa Grande e Senzala

23/05/2019

-No Brasil é coisa rara o racismo
-É, isso não cola
-Ficam o tempo todo tentando jogar negro contra branco, homo contra hetero… E desculpe o linguajar, mas já encheu o saco isso daí 
-É chato, chato

 

Quem seriam os envolvidos neste insólito diálogo? Caso o leitor não saiba, aqui vai a resposta: ninguém menos que o presidente da República e uma apresentadora de tevê. E não foi em um áudio vazado, mas em rede nacional durante uma entrevista exibida dias atrás.

 

Aliás, não é de hoje que Jair Bolsonaro é convidado de Luciana Gimenez em seus programas na Rede TV!. 
Desde a época em que era deputado, defendendo pautas e dando declarações polêmicas, o atual presidente é figura carimbada em uma das atrações de pior nível da tevê aberta.

 

Sim, Gimenez concorda que racismo é coisa rara por aqui. Ela, dois anos atrás, apagou das redes sociais um vídeo da festa de aniversário do filho Lucas, no qual dizia ao se aproximar da cozinha de sua casa, onde sete empregados trabalhavam: “Vem cá, tá rolando uma bagunça aqui na senzala, é?”. 

 

Brincadeirinha inocente, né mesmo?

 

Gratidão – Jair Bolsonaro não esquece do espaço cativo que conquistou na Rede TV! quando ainda buscava voos maiores na política e fazia parte do chamado “baixo clero” do Congresso. Mês passado, em uma café da manhã com jornalistas em Brasília, Gimenez foi uma das convidadas – apesar de não ser jornalista. Na ocasião, ela definiu a questão da reforma da Previdência como “o elefante azul da sala”. “Tem que falar o que tá rolando”, sugeriu.

 

Aliás, justamente para isso, Luciana Gimenez acaba de ser contratada pelo governo. Será garota-propaganda da reforma, função que, afirmou, fará “com muito orgulho”. Além dela, receberão cachês de R$ 500 mil para estrelarem a campanha os apresentadores Ratinho, Rodrigo Faro, Ana Hickmann, Milton Neves e os jornalistas Renata Alves e José Luiz Datena. Aliás, eticamente, um jornalista aceitar este tipo de papel é o fim da picada.   

 

O fato é que vivemos um momento surreal, no qual tudo parece ser cabível. Não parece haver limites para o absurdo grotesco – inclusive concordar que, no Brasil, “é coisa rara o racismo”. 

 

Foto: Reprodução/RedeTV