TV em Transe

Uma rebelde que fará falta

29/08/2019

A partida precoce de Fernanda Young, aos 49 anos, deixa uma lacuna irreparável na dramaturgia da tevê. Seus roteiros conseguiam unir humor, crítica e ironia, retratando situações do cotidiano de forma ímpar na telinha. E sempre em parceria com o marido, Alexandre Machado. 

 

Talvez o auge criativo tenha sido com o já clássico “Os Normais”. Mas Fernanda fez muito mais desde que debutou como roteirista em “A Comédia da Vida Privada” (1995). Vale destacar também “Os Aspones”, “Super Sincero” e “Minha Nada Mole Vida”.

 

As incursões como apresentadora, como em “Irritando Fernanda Young” e “Duas Histéricas” nunca foram tão boas como as comédias que roteirizou – o que não é demérito algum.

 

Em seu último trabalho, “Sippados”, ela voltou a retratar o cotidiano de um casal (sua especialidade). A série chegou em junho ao serviço de streaming Globoplay. São 12 episódios, estrelados por Eduardo Sterblitch e Tatá Werneck.

 

Asma – Fernanda Young faleceu em decorrência de uma crise asmática, seguida por uma parada cardíaca. Em 2013, ela publicou um texto sobre o assunto em uma rede social – mordaz e certeiro, como de costume:
“2:00 da manhã, a crise de asma me leva a farmácia. Tenho 80 reais e um cartão AMEX. O SISTEMA esta com problema. Valor da compra: 87 reais. Asma pode matar, e já tive crises severas. Peço um desconto. O vendedor diz que não pode. Estou passando mal e explico, ele se nega a ajudar. Tento ser rápida, preciso do medicamento. Ele diz que com receita é mais barato. Peço, nervosa, compaixão. O rapaz, Marcos, insiste que não. A culpa é do Sistema e ele não vai dar desconto, nem pagar do próprio bolso. Digo que sou mãe, que sou conhecida, que posso ter algo grave. Resolvo por um remédio e deixo o outro. Uso imediatamente. Ameaço expor a farmácia por antiética, ninguém liga. Saio de lá um pouco melhor, passo em outra farmácia, O Sistema aceita, e e eu o uso. Agora em casa penso sobre como é banal morrer aqui.

 

No Brasil morrer é dar uma morridinha, como dar uma trepadinha, uma corridinha, uma dançadinha. Dane-se a vida. Um ciclista morre, e dane-se. Casas caem e danem-se, jovens se queimam enquanto comemoram e danem-se. São só morridinhas. Drogaria, estou melhor, e dane-se eu”. 

 

Uma rebelde que fará falta, ainda mais nos tempos sombrios que vivemos.

 

Foto: Bob Wolfenson/Divulgação