Digital Jazz

A bossa nova no Carnegie Hall 1962 – 2019

19/11/2019

Na noite de 21 de novembro de 1962, uma quarta-feira chuvosa, a Bossa Nova viveu um dos capítulos mais importantes da sua existência. Mudaria o rumo da sua história e dos seus principais protagonistas. 

 

Era a noite da Bossa Nova para os americanos verem e ouvirem ao vivo e a cores, num dos seus maiores templos culturais dos Estados Unidos: o Carnegie Hall, de Nova York.

 

Aconteceu graças ao empenho da gravadora americana Audio Fidelity e do governo brasileiro, através do Itamaraty e o show foi cercado de muitas polêmicas e incertezas. 

 

A apresentação começou a ser organizada muitos meses antes daquela noite, quando o executivo da gravadora Audio Fidelity, Sidney Frey veio ao Brasil e conheceu pessoalmente o famoso Beco das Garrafas e os principais artistas que por lá se apresentavam.

 

A sua pretensão inicial previa apenas a apresentação de Tom Jobim e João Gilberto. Depois mudou de ideia e reuniu um time bem diversificado.

 

Os músicos brasileiros que se apresentaram, eram bastante jovens e para lá foram Antonio Carlos Jobim, João Gilberto, Luiz Bonfá (os únicos que já tinham algum prestígio) e mais Oscar Castro Neves, Sérgio Mendes, Roberto Menescal, Carlos Lyra, Chico Feitosa, Milton Banana, Sérgio Ricardo, Normando Santos, Dom Um Romão,  Agostinho dos Santos e outros nomes desconhecidos.

 

Na plateia lotada por mais de 3.000  pessoas, alguns nomes da primeira linha do Jazz: o cantor Tony Bennett, os trompetistas Dizzy Gillespie e Miles Davis, os saxofonistas Gerry Mulligan e Cannonball Adderley, o flautista Herbie Mann, o The Modern Jazz Quartet. E muitos deles, inclusive foram recepcionar o time de músicos brasileiros no aeroporto quando eles chegaram em solo americano. E uma grande prova de que a Bossa Nova influenciou o Jazz e vice-versa.

 

A primeira consequência imediata deste show, o fato de muitos destes músicos americanos gravarem o repertório da Bossa Nova e isso serviu para que o gênero ganhasse o mundo e rompesse as suas fronteiras territoriais.  A segunda e mais marcante, determinou que alguns dos músicos brasileiros trocassem o Brasil pelos Estados Unidos. Oscar Castro Neves, Sérgio Mendes e Tom Jobim e João Gilberto abriram mercado por lá imediatamente depois daquela apresentação.

 

A partir daquela noite em 1962, a Bossa Nova não foi mais a mesma. E não poderia ser diferente. 

 

57 anos depois daquele show, a Bossa Nova é macro: um estilo, um gênero, um ritmo, um movimento que está presente em todas as partes do planeta, revigorado e sempre atualizado Ou simplesmente, uma forma de execução do samba, eternizada a partir da batida do violão de João Gilberto.

 

 

Ella Fitzgerald – “Ella Abraça Jobim”

 

Este álbum é fundamental. Foi gravado em apenas 4 dias no início da década de 80 e lançado pelo selo Pablo, que na época, lançou discos muito importantes de alguns dos maiores nomes do Jazz.

 

A fantástica Ella Fitzgerald, considerada como a primeira dama do Jazz, foi um destes nomes que tiveram a sorte de ter seus trabalhos lançados pelo selo e este trabalho dedicado exclusivamente ao nosso maestro Tom Jobim, teve a produção do competente Norman Granz e os arranjos e direção da orquestra de Erich Bulling.

 

E apesar de ser um “songbook”, curiosamente ele não entra na lista oficial de “songbooks” que Ella gravou nos anos 60, homenageando diversos compositores e que viraram verdadeiras obras-primas.

 

Foi lançado como álbum duplo em vinil (que ainda tenho a sorte de ter o original) e ganhou a esperada versão em CD apenas no ano de 1991, com 17 temas, 2 a menos que a versão original em LP. 

 

Nada que comprometa, e você deixará apenas de ouvir “Don’t Ever Go Away”, versão de “Por Causa De Você” e “Song Of The Jet”, versão de “Samba Do Avião”. Belas gravações que só estão nas “bolachas”.

 

Outro ponto importante do disco foi a seleção de músicos escalados: Clark Terry no trompete, Zoot Sims no sax tenor, Joe Pass na guitarra, Toots Thielemans na harmônica, Abraham Laboriel no contrabaixo, Alex Acuna na bateria e os brasileiros Oscar Castro Neves no violão e Paulinho da Costa na percussão entre outros.  

 

Destaque para algumas versões cantadas em português, carregadas de um sotaque simpático e as minhas preferidas são “Dreamer” (Vivo Sonhando), “Triste” e “Dindi” em levadas mais românticas e “Useless Landscape” (Inútil Paisagem), “One Note Samba” (Samba de Uma Nota Só) e “Water To Drink” (Água De Beber) com “scats” de arrepiar, marca registrada de Ella Fitzgerald. Só ficou faltando a participação do grande homenageado. 

 

 

Sarah Vaughan – “Brazilian Romance”


 

Três anos antes de falecer a cantora Sarah Vaughan, outra grande diva do Jazz também visitou o repertório brasileiro. 

 

E não foi a primeira vez que “Sassy”, como era carinhosamente chamada, fez isso na sua vitoriosa carreira.

 

Em 1987, pelo selo CBS lançou “Brazilian Romance”, outro disco com fortes influências do Brasil e que foi seu penúltimo trabalho. O último, foi ao lado de Quincy Jones em “Back On The Block” (1989), na inesquecível gravação de “Setembro”, tema de Ivan Lins. Uma emocionante despedida.

 

A produção do disco foi assinada pelo premiado Sérgio Mendes e os arranjos ficaram por conta de Dori Caymmi. 

 

E contou com as participações de George Duke nos teclados, Alphonso Johnson no contrabaixo, Carlos Vega na bateria e também Milton Nascimento nos vocais, Hubert Laws na flauta e Tom Scott e Ernie Watts nos saxofones.

 

A sonoridade do disco surpreende pela modernidade e também pelo refinamento da orquestra de cordas, que deu um colorido todo especial ao trabalho.

 

A canção “Love And Passion” com a participação de Milton Nascimento ficou perfeita. E também “So Many Stars”, “Photograph”, “Wanting More” e “Romance” merecem meu destaque.

 

No ocaso da sua carreira, Sarah Vaughan apresentou um trabalho com pitadas do “smooth jazz”, pianos elétricos e sintetizadores. Ares de ousadia para esta cantora tão tradicional.

 

Sua voz permanece forte e marcante e nas 10 faixas do disco, podemos conferir todo seu talento e competência. Sarah, divina e incomparável.