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Anti-inflamatório acelera recuperação de pacientes hospitalizados por covid-19

18/08/2020

Resultados de um estudo clínico conduzido por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto indicam que a colchicina – medicamento usado há décadas no tratamento da gota – pode ajudar a combater a inflamação pulmonar e a acelerar a recuperação de pacientes com as formas moderada e grave da COVID-19.

Resultados da pesquisa, apoiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), foram divulgados na plataforma medRxiv, em artigo ainda sem revisão por pares.

 

“Voluntários tratados com o fármaco ficaram livres da suplementação de oxigênio, em média, três dias antes do que os pacientes que receberam apenas o protocolo terapêutico padrão do hospital. Além disso, puderam voltar para casa mais cedo”, conta à Agência Fapesp o médico Renê Oliveira, que coordenou o estudo no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto.

 

De acordo com Paulo Louzada Junior, coautor do artigo, a redução observada no tempo de recuperação dos doentes pode representar uma economia significativa para a rede pública de saúde, além de permitir o atendimento de um número maior de pessoas em um mesmo período.

 

“Cada dia de internação em unidade de terapia intensiva [UTI] pode custar entre R$ 5 mil e R$ 10 mil por paciente. A suplementação com oxigênio, mesmo quando é feita fora da UTI, também é uma terapia cara. A colchicina, por outro lado, é um medicamento barato e com potencial de uso em larga escala. O tratamento completo custou cerca de R$ 30 por paciente”, afirma Louzada Junior.

 

Vantagens

Outra vantagem do fármaco, segundo os pesquisadores, é o fato de seus eventos adversos serem amplamente conhecidos pelos médicos, sendo o principal deles a diarreia. “De modo geral, a colchicina é considerada segura. Mas é importante ressaltar que, no caso da COVID-19, os benefícios foram observados apenas em pacientes hospitalizados e com algum nível de comprometimento pulmonar. Não recomendamos o uso indiscriminado do fármaco, nem para prevenção e nem para tratar sintomas leves da doença”, destaca Louzada Junior.

 

Evidência padrão-ouro

Para testar a hipótese de que a colchicina poderia amenizar a tempestade de citocinas inflamatórias que costuma ocorrer nos quadros mais graves de COVID-19, os pesquisadores da USP conduziram, entre os dias 1º de abril e 6 de julho, um ensaio clínico controlado, randomizado e duplo-cego.

 

Esse é o tipo de estudo considerado padrão-ouro para guiar a prática clínica, pois, como nem os médicos e nem os pacientes sabem quem de fato está tomando o composto em teste, o risco de vieses (por exemplo, selecionar pacientes mais ou menos graves para determinado grupo) é reduzido.

 

Os 38 participantes foram divididos aleatoriamente em dois grupos, ambos tratados com o protocolo terapêutico padrão do hospital para COVID-19. Um dos grupos recebeu adicionalmente a colchicina e, o outro, placebo. O trabalho foi realizado no âmbito do Centro de Pesquisa em Doenças Inflamatórias (CRID), um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) da Fapesp na FMRP-USP.

 

Foram incluídos pacientes com insuficiência respiratória que precisaram ser internados para receber suplementação de oxigênio. “Não incluímos no estudo pacientes intubados e mantidos em UTI, mas não haveria contraindicação clínica para o uso da colchicina também nesses casos. Esse perfil de paciente pode vir a fazer parte da próxima fase do ensaio clínico”, diz Oliveira.

 

Resultados

Ao comparar os resultados dos grupos, os pesquisadores concluíram que a colchicina promoveu benefícios em três parâmetros: reduziu o tempo de oxigenoterapia, reduziu o tempo geral de internação e diminuiu mais rapidamente os níveis de proteína C-reativa no sangue, molécula considerada o principal marcador de inflamação sistêmica. “Após sete dias de tratamento, os marcadores inflamatórios retornaram aos níveis normais”, conta Louzada Junior.

 

A próxima fase do ensaio clínico será aberta, ou seja, os pacientes serão convidados a participar e terão a certeza de estarem tomando o medicamento. Os critérios de inclusão serão menos restritos, podendo participar, por exemplo, pacientes com câncer e outras doenças crônicas, conta Oliveira.