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O jogo da enganação

28/02/2020
O jogo da enganação | Jornal da Orla

Osvaldo Aranha, um político e diplomata dos mais influentes durante o governo de Getúlio Vargas, disse certa vez que o Brasil “é um deserto de homens e ideias”. Foi um desabafo diante da incapacidade de a elite encontrar soluções para os principais problemas do país. Nunca uma frase soaria tão atual nos dias de hoje como a proferida por Aranha.

 

É triste constatar que somos governados por gente que não está à altura dos cargos relevantes que ocupam. Jair Bolsonaro dispensa comentários – seus palavrões, seus ataques baixos às mulheres, gays, negros e outras minorias, bananas a jornalistas e o desprezo pela democracia falam por si. É acompanhado no governo por um bando de bajuladores, daqueles que batem palmas para maluco dançar.

 

No Congresso Nacional os desclassificados que o comandam têm um pouco mais de verniz. Apenas isso. Davi Alcolumbre, no Senado, e Rodrigo Maia, na Câmara Federal, são acompanhados, em uma desafinada sinfonia, por Dias Toffoli, o presidente do STF, que ganhou o cargo de ministro do amigo Lula da Silva por inestimáveis serviços prestados ao PT, mesmo reprovado em dois concursos para juiz.

 

De um certo modo, todos eles participam de um mesmo jogo, embora finjam ser de times diferentes. Afinal, só o Brasil possui duas coisas genuinamente nacionais: a jabuticaba e uma espécie de democracia que garante direitos e privilégios especiais para uma pequena casta (a deles). 

 

É essa inusitada forma de governo que permite que um suposto adversário do atual governo, o ex-presidente Lula, condenado em três instâncias por corrupção e lavagem de dinheiro, possa fazer um tour pela Europa e ainda leve consigo quatro auxiliares, todos eles bancados pelos contribuintes. 

 

A farra é ampla, geral e irrestrita para os poderosos de Brasília. Maia, Alcolumbre e Toffoli usam e abusam dos jatinhos da FAB – cuja viagem custa em média R$ 300 mil. Só Maia fez 250   apenas em um ano. No STF, os guardiões da Constituição degustam lagostas e vinhos premiados internacionalmente e desfrutam de outros benefícios inacreditáveis. Enfim, mordomias são compartilhadas generosamente entre eles. Chamam isso de democracia, embora não se veja algo parecido em nenhum país civilizado.

 

O jogo de ilusão consiste em fingir que estão em lados opostos: o presidente faz ofensas, ameaça o sistema democrático e comete outras maluquices em público, mas, em reuniões privadas, todos eles se entendem.

 

O fato é que milhões de brasileiros ainda não se deram conta de que Jair Bolsonaro só chegou ao Palácio do Planalto em razão das desgraças produzidas pelos governos populistas do PT. Politicamente, Bolsonaro é filho de Lula com Dilma. Sem eles, continuaria sendo um obscuro parlamentar a vagar pelo Congresso sem conseguir aprovar um único projeto.

 

Talvez o Brasil não seja um deserto de homens e ideias, como disse Oswaldo Aranha, mas de gente esperta o suficiente para iludir e enganar sistematicamente milhões de eleitores.

 

Foto: Marcos Correa/PR