Geral

O Garçom desonesto

12/05/2020

FERNANDO MONTANHA*

Em 1993, a escritora americana Deborah Lipstad publicou nos EUA o livro “Negando o Holocausto: O Crescente Ataque à Verdade e à Memória”. Na obra, ela citava essencialmente outras publicações que defendiam, à época, que o Holocausto nunca acontecera. Em não mais do que uma página, ela abordou como um escritor britânico, chamado David Irving, interpretava de modo equivocado documentos para produzir seu argumento central de que as câmaras de gás nunca funcionaram para exterminar judeus. Assim que o livro foi editado na Inglaterra, Irving a processou no seu país. E ela perderia, caso a ação corresse à revelia. E pior: como na justiça da Inglaterra não existe a presunção da inocência, Deborah é que teria que provar que estava falando a verdade e não o seu acusador. Perdeu alguns anos de sua vida tendo, inclusive, que ir a Londres.

No julgamento, que durou até 2001, Irving, para defender os equívocos cometidos em seu livro, argumentou que até os melhores historiadores cometem falhas.

Mas, o brilhante advogado de defesa de Deborah usou uma analogia bem interessante, citando um garçom – imaginário ou real – que sempre o atendia num Café próximo ao seu escritório.

 

Todos os dias o advogado pagava a sua conta com uma nota de 10 Libras, mas nunca conferia o troco. Um dia percebeu que o troco estava errado e a partir daquele dia passou a conferir sempre, sem que o garçom percebesse. Depois de alguns dias, deixou de frequentar o Café, pois notou que o erro era constante e sempre para menos. Ele poderia presumir que o garçom errava por descuido ou por falta de atenção, mas justificou seu julgamento alegando que quem se descuida ou erra sem querer, vezes erra para mais, vezes para menos, mas o garçom sempre levava vantagem no seu erro, o que demonstrava que era, de fato, um garçom desonesto. Ele usou isso, para mostrar ao juiz que todos os “erros” do historiador só serviam para reafirmar sua própria crença, o que o tornava desonesto com os fatos.

 

Vejo o mesmo com pessoas que propagam fakenews. Elas têm a chance de conferir se a notícia é verdadeira, diante da facilidade que temos hoje em pesquisar, mas elas preferem compartilhar, sem nenhum cuidado, simplesmente porque aquela notícia, mesmo sendo falsa, é concordante com suas crenças ou desejos.

 

Reparo que, praticamente, são sempre os mesmos que compartilham tais publicações.

 

Chego á conclusão que, assim como a garçom citado pelo advogado, essas pessoas possuem o mesmo desvio de caráter: desonestidade.

 

Todos temos o direito de ter nossa própria opinião e seguir a ideologia que quisermos. Mas usar mentiras, distorção de fatos e situações fora de contexto para reafirmar seu pensamento é contribuir em nada para o futuro do país que você diz que tanto ama.

 

Pense nisso, de verdade!

 

*Fernando Montanha é publicitário, proprietário da Fenômeno Propaganda