Está aí uma coisa que não nos damos conta sempre: um dia isso vai acabar.
Quando passamos a viver de verdade? Quando nos damos conta disso?
A vida é suave e frágil como o canto de um pássaro. Como um canto de um pássaro? Então devemos acrescentar: suave, frágil e linda. E breve também. Adicione isto, por favor.
Falhamos muitas vezes durante a vida toda em compreender a nossa mortalidade. Em não a apreciar ou aproveitá-la. Apreciar a mortalidade, não a morte. Veja bem, são duas coisas totalmente diferentes.
Já falei em outros textos, mas volto a citar aqui duas lendas. Uma grega e outra brasileira.
A lenda grega diz que os deuses invejavam a mortalidade humana. A nossa capacidade de experimentar a sensação de viver um momento como se fosse o último. Isto é único. Literalmente.
A brasileira é o Chico Anysio (ele mesmo já é a lenda).
Quando perguntado se tinha medo de morrer, respondeu: eu tenho pena.
E a gente acreditava que “professor” era só a profissão de um personagem dele, né? Que aula de vida em três palavras!
Entender que vamos morrer um dia, realmente compreender que isto é um fato, não é pessimismo, “bad trip” ou morbidez. Pelo contrário. Compreender que isto vai acontecer um dia, mas, que até lá, em todos os outros não, é justamente querer vivenciar ao máximo este pequeno intervalo que nos foi concedido desde que fomos concebidos. Curtir a viagem, sabe?
Em algum lugar, um relógio em contagem regressiva já começou a trabalhar. Um para cada um. Mas, para que ficar procurando pelo placar quando você pode aproveitar a partida enquanto a bola está rolando e ainda é possível se divertir? Aliás, é pelo que você faz em campo que a torcida se lembrará para o resto da vida.
Ah sim! Esta é a maneira de mudar um pouco isso. De hackear o tempo e atravessá-lo, passe ele o quanto passar. Seja a memória em alguém. Faça alguém rememorar com carinho de você. Faça-a sorrir ao ver algo bobo, simples, sem sentido algum e lembrar-se de você. E faça isso hoje.
Não é preciso muito. Você não precisa mudar o mundo ou fazer algo grandioso. Quando forem perguntar de você, a quem realmente te conhecia, é da sua risada esquisita, do seu jeito apressado de falar, da forma engraçada como você dormia que irão se lembrar.
A vida é enorme, gigante. Mas ela é marcante por detalhes.
Nós não somos imortais, mas podemos ser eternos.
E parafraseando Renato Russo, a gente insiste em acreditar que tudo será pra sempre, mesmo sabendo que o pra sempre acaba.
Talvez a graça esteja justamente aí.
Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete a linha editorial e ideológica do Jornal da Orla. O jornal não se responsabiliza pelas colunas publicadas neste espaço.