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Irena Sendler – Quando a Bondade Transcende os Limites

15/07/2021
Irena Sendler –  Quando a Bondade Transcende os Limites | Jornal da Orla

Com as contínuas comemorações do aniversário da revolta do gueto de Varsóvia, foi gerado um interesse renovado nas ações dos gentios poloneses que ajudaram os judeus durante a ocupação nazista.
 
Algumas equipes de resgate esconderam indivíduos judeus que conseguiam fugir das "aktions" e guetos assassinos dos alemães, enquanto outros falsificaram documentos de identidade para judeus e participaram de outras atividades que salvaram vidas judias.
 
Uma assistente social, Irena Sendler, conseguiu salvar mais de 2.500 vidas judias, mas suas atividades foram quase esquecidas até que um grupo de estudantes rurais do Kansas ouviu rumores sobre seus esforços durante a guerra e embarcou em um amplo projeto de pesquisa para divulgar sua incrível história.
 
Irena nasceu em 15 de fevereiro de 1910, em Varsóvia, filha única do casal Krzyzanowski. Ela cresceu em Otwock, uma cidade a cerca de 15 milhas (24 km) a sudeste de Varsóvia, onde havia uma comunidade judaica.

 
Ardente socialista, seu pai não cansava de ensinar à pequena Irena que o ato de ajudar devia ser para todo ser humano uma necessidade que emanasse do coração, não importando se o indivíduo a ser ajudado era rico ou pobre, nem a que religião ou nacionalidade pertencia. Como médico e humanitário, ele tratava os muito pobres, incluindo judeus e morreu em fevereiro de 1917 de tifo contraído de seus pacientes.
 
Após sua morte, a comunidade judaica ofereceu ajuda financeira para a viúva e sua filha.
Na juventude, Irena estudou literatura polonesa e se filiou ao Partido Socialista. Na década de 1930, quando o endêmico antissemitismo polonês aumentava sua virulência, Irena foi expulsa da Universidade de Varsóvia por enfrentar um professor que obrigara os alunos judeus a se sentar em local separado, na classe. A jovem foi para o "setor judaico" da sala e quando o professor lhe disse para mudar de lugar, respondeu: "Hoje sou judia".

Quando a Segunda Guerra Mundial estourou, Irena Sendler era uma assistente social de 29 anos, empregada pelo Departamento de Bem-Estar do município de Varsóvia. 
 
Após a ocupação alemã, o departamento de Bem Estar continuou a cuidar do grande número de pobres e despossuídos da cidade. Irena Sendler aproveitou seu trabalho para ajudar os judeus, mas isso se tornou praticamente impossível depois que o gueto foi fechado em novembro de 1940. 
 
Irena se juntou à resistência polonesa e filiou-se à Zegota, um conselho oficial polonês para o resgate de judeus, tornando-se líder da divisão que cuidava das crianças, sob o codinome Jolanta.
 
Em depoimento ao Yad Vashem, Irena contou: "Consegui, para mim e minha amiga Irena Schultz, identificações do Gabinete Sanitário, que tinha como tarefa, entre outras, lutar contra as doenças contagiosas. Aleguei que não íamos ajudar judeus, mas apenas fazer um levantamento diário das condições sanitárias.
Com esse estratagema, as duas Irenas podiam entrar no gueto quando quisessem. Uma vez dentro da área onde viviam 400 mil judeus, as jovens imediatamente reatavam seus antigos contatos.

Diariamente – e mais de uma vez em um único dia – cruzavam os portões levando escondido em suas roupas, alimentos, roupas, remédios e dinheiro que obtinham do próprio Departamento de Bem-Estar Social, apresentando documentos que elas mesmas falsificavam.

Para não despertar a suspeita dos guardas alemães, entravam sempre por portões diferentes e, uma vez dentro do gueto, Irena usava no braço a Estrela de David. Além de ser uma forma de mostrar sua solidariedade, ela se confundia entre a população e "ninguém me pedia documentos ou questionava o que eu fazia".

Com o passar dos meses, as condições de vida no gueto se tornaram ainda mais terríveis. Sabe-se que a partir de junho de 1941 o número mensal de mortes chegou a 5 mil.
Irena estava definitivamente convencida de que a única forma de salvar alguém daquele inferno era ajudando-o a fugir. Passa, então, a trabalhar na organização das fugas. Os primeiros a serem retirados foram as crianças órfãs.

À medida que a situação se agravava para os habitantes do gueto, Sendler foi além de resgatar órfãos e começou a pedir aos pais que a deixassem tentar colocar seus filhos em segurança. 
 
Embora ela não pudesse garantir a sobrevivência dos filhos, ela poderia dizer aos pais que seus filhos teriam pelo menos uma chance. 
 
Sendler manteve em um frasco enterrado os registros detalhados e listas das crianças que ela ajudou. Seu plano era reunir as crianças resgatadas com seus pais após a guerra. No entanto, a maioria dos pais não sobreviveu.
 
Em 20 de outubro de 1943, Sendler foi presa. Ela conseguiu esconder evidências incriminatórias, como endereços codificados de crianças aos cuidados do Zegota e grandes somas de dinheiro para pagar os que ajudaram os judeus. 
 
Ela foi torturada, condenada à morte e enviada para a infame prisão de Pawiak, mas ativistas clandestinos conseguiram subornar funcionários para libertá-la. 
 
Seu encontro próximo com a morte não a impediu de continuar sua atividade. Após sua libertação em fevereiro de 1944, embora soubesse que as autoridades a vigiavam, Sendler continuou suas atividades clandestinas. 
 
Mais de 50 anos após a guerra, Sendler descreveu a agonia daqueles dias. “Eu conversava com as mães sobre seus filhos. Essas cenas sobre se dar um filho ou não foram de partir o coração. Às vezes, elas não me davam o filho. A primeira pergunta era: ‘Que garantia existe de que a criança viverá?’ Eu disse: ‘Nenhuma. Eu nem sei se vou sair do gueto viva hoje. ”
 
"A única certeza era que se lá permanecessem, a probabilidade de sobreviver era praticamente nula. Eu sabia que os primeiros a serem mortos pelos nazistas eram as crianças. Às vezes, o pai aceitava a ideia, mas a pobre mãe relutava; era como rasgar sua carne. Eu entendia a dor deles, mas a indecisão foi fatal, em muitos casos. Quando voltava para tentar fazê-los mudar de ideia, já não mais os encontrava… Haviam sido levados para os campos da morte".
 
Irena Sendler foi homenageada por organizações judaicas internacionais – em 1965 ela recebeu o título de Justa entre as Nações pela organização Yad Vashem em Jerusalém – em 1991 ela foi nomeada cidadã honorária de Israel.
 
Essa mulher adorável e corajosa foi uma das trabalhadoras mais dedicadas e ativas na ajuda aos judeus durante a ocupação nazista da Polônia. Sua coragem possibilitou não apenas a sobrevivência de mais de 2.500 crianças judias, mas também das gerações de seus descendentes.
 
Ela faleceu em 12 de maio de 2008, aos 98 anos.